Certas PalavrasPágina de Marco Neves sobre línguas e outras viagens

A aventura das línguas na Eurovisão

Falar do ucraniano — ou do português! — a propósito da Eurovisão ainda vá. Agora do basco, do catalão e do galego é que não lembra ao diabo.

Este artigo foi escrito em 2017, no rescaldo da vitória de Salvador Sobral na Ucrânia.

Quando eu era novo, pensava que ganhar a Eurovisão era importante. Não é, claro. Mas esta vitória foi como um sonho vindo das profundezas da nossa infância. Como se recebesse aos 36 a prenda que me prometeram aos 10.

Pois vou aproveitar esta loucura toda com o concurso, loucura essa que deve terminar daqui a uns dois ou três dias, para falar de — surpresa! — línguas. E línguas ibéricas, pois então — afinal, a Península Ibérica arrasou no festival: ficámos em primeiro e os nossos vizinhos em último…

Andorra na Eurovisão, em 2004. [Fonte.]

O catalão e o galego na Eurovisão

Há línguas muito antigas e com pergaminhos de fazer inveja e que não aparecem na Eurovisão. Basta andar uns quilómetros na nossa península e temos o basco, a mais isolada das línguas europeias. Que eu saiba, ninguém alguma vez cantou em basco na Eurovisão, o que é uma pena. Já não acontece o mesmo com o catalão, que foi ouvido entre 2004 e 2009 por causa de Andorra, que lá andou metida.

A primeira canção em catalão ouvida por essa Europa foi «Jugarem a estimar-nos» (não fiquem preocupados comigo: é para saber estas coisas que serve a Wikipédia).

O que quer dizer este título? O verbo «jugar» — que se lê à portuguesa, tal e qual o nosso «jogar» — quer dizer «brincar».

No caso, a forma «jugarem» (primeira pessoa do plural do futuro) lê-se com a sílaba tónica na última vogal e o «m» bem marcado. Será algo como a inexistente palavra portuguesa «jugareme». Corresponde ao nosso «brincaremos».

O verbo «estimar» quer dizer «amar». Logo, o título quer dizer algo como «vamos brincar ao amor» ou «vamos lá fingir que nos amamos, mas só durante esta noite». Os andorranos são assim, o que querem?

E o galego? Ah, foi com um sorriso na boca que vi muitos amigos galegos a afirmar que uma canção na sua língua tinha ganho o festival. Andaram a circular memes com uma frase do género: «O galego não serve para nada? Serve para ganhar a Eurovisão!»

Já o espanhol… Enfim, este ano apareceu por lá de raspão e levou cinco pontinhos muito portugueses.

As línguas da Ucrânia — e da Catalunha

Num festival organizado na Ucrânia, lá ouvimos umas palavras, aqui e ali, nessa língua. No final, até Salvador Sobral disse umas palavras em ucraniano.

Ora, já aqui falámos como aquele país, o segundo maior da Europa, tem questões linguísticas complexas. Não só neste artigo que escrevi sobre a questão linguística naquele país, como também no artigo sobre a ligação entre o nosso acordo ortográfico e a Ucrânia — e ainda o artigo de Serge Lunin sobre o bilinguismo na Ucrânia… e em Portugal!

Julgo que a situação da Ucrânia pode ajudar-nos a perceber o que aconteceria se a Catalunha ficasse independente. Diga-se que o catalão é uma língua minoritária muito mais bem protegida do que outras línguas minoritárias por esse mundo fora — e mesmo em Espanha. Está presente no ensino (de forma intensiva), é usada na literatura, na televisão e por uma percentagem muito significativa da população.

No entanto, não está, digamos assim, garantida. Ao contrário do que acontece com outras línguas não castelhanas de Espanha, o catalão tem prestígio e um apoio social de fazer inveja. Mas ainda corre perigo de o seu uso diminuir e de passar a ser uma língua residual, como é hoje, por exemplo, o irlandês na Irlanda, por mais prestígio que tenha nas instituições da ilha.

O catalão tem ainda este problema: não é reconhecido noutros países. Basta olhar à nossa volta: é difícil para muitos portugueses identificar aquela língua — ora, a língua é uma marca de identidade e a dificuldade de ser identificada pelos outros é um problema mais sério do que possa parecer à primeira vista. Pensem no que sentimos nós quando um estrangeiro nos diz «ah, a vossa língua é muito parecida com o espanhol» com um ar de uma certa indiferença. Os catalães nem sequer chegam a ouvir a frase porque os estrangeiros raramente sabem distinguir as duas línguas. E é pena.

Essa necessidade de identificação pelos falantes de outras línguas tem — quanto a mim — um grande peso no sentimento independentista de muitos povos. O independentismo pode ter razões histórias, económicas, sociais, etc. Mas não deixa de ser, lá bem no fundo, uma necessidade de reconhecimento internacional da nação com a qual nos identificamos. Muitos catalães sentem-se um povo e não como um subgrupo dentro doutro povo maior — e este sentimento transporta-se inevitavelmente para a necessidade de reconhecimento da sua língua.

E, depois, há isto: perguntem a uns quantos madrilenos se achariam bem Espanha levar uma música em catalão à Eurovisão — afinal, o catalão é a língua materna de vários milhões de espanhóis, não é verdade?

Se aceitarem o desafio, registem as respostas — talvez assim comecemos todos a perceber porque é difícil para os catalães encaixarem o seu sentimento nacional nesta Espanha tão castelhana.

E a Escócia?

Curiosamente, a Escócia, apesar de politicamente estar numa situação semelhante à catalã (é uma parte dum Estado maior com leis próprias, um grau de autonomia elevado e um sentimento de pertença nacional muito marcado), sente menos a indiferença dos outros povos.

Porquê? Talvez porque ostenta algumas das marcas de país na cabeça de todos nós: o seu nome é reconhecido no mundo inteiro, as suas tradições mais ou menos inventadas são bem visíveis (kilts e outros que tais), o Estado onde está integrada não esconde o facto de ser um Estado com uma identidade complexa (para dizer o mínimo), etc., etc.

Ah, e tem uma selecção de futebol que joga nos campeonatos que interessam. Não é coisa pouca.

É difícil ser bilingue?

Bem, mas já estamos muito longe do tema do texto. Voltemos à língua. Se a Catalunha se tornasse independente, o catalão seria a língua principal do novo Estado — disso não tenho dúvidas. Mas uma grande parte das famílias continuaria a falar espanhol em casa e na rua.

As tensões que iriam surgir — ou melhor, que iriam persistir, porque já lá estão, claramente — têm algumas parecenças com o que se passa na Ucrânia. De repente, a língua de prestígio do Estado (o espanhol em Espanha; o russo na União Soviética) passaria a ser a língua minoritária no novo Estado (o espanhol na Catalunha; o russo na Ucrânia). Em caso algum a Catalunha seria um país monolingue como é hoje Portugal — tal como a Ucrânia também não é.

Tanto num caso como no outro, os que imaginam uma sociedade monolingue em que há uma língua absolutamente predominante (como acontece, por exemplo, em Portugal) têm de se habituar a viver numa sociedade bilingue com o desconforto associado. Têm mesmo de se habituar à situação — não há muito a fazer e talvez até fosse bom aproveitar o que de bom tem o bilinguismo: todos os cidadãos podem aprender as duas línguas, o que não tem mal nenhum e permite aos ucranianos ler a boa literatura russa e aos futuros catalães independentes (se tal vier a acontecer) continuar a saber usar com mestria e talento a língua castelhana.

Já os espanhóis duma Espanha reduzida ficariam na pior situação de todas: saberiam espanhol e ponto final. Apesar de todas as tensões, saber duas línguas é sempre melhor do que saber só uma. O bilinguismo é desconfortável para o sentimento de identidade (que tende para o simplismo), mas faz bem à vida de cada pessoa bilingue em particular.

A que soa o português?

Uma vitória na Eurovisão não serve para nada — nem tinha de servir. A Eurovisão é uma maluqueira muito europeia. Com algum esforço, vislumbro uma vantagem daquela explosão de luzes e fogo de artifício: o festival andou anos a criar memórias comuns aos europeus, o que não é coisa pouca.

Quanto ao nosso vencedor, o que temos agora é uma música em português que de repente está nas rádios de vários países. Uma música que ajuda os ouvidos destreinados dessa Europa de tantos países a reconhecer bem a nossa língua.

Isto não é coisa para mudar o estado da música portuguesa — seja ele qual for. E ainda bem. Mas, como disse lá em cima, a ligação entre língua e identidade leva-nos a querer que os outros nos reconheçam. É também por isso que sabe bem a um português ver gente de tantos países a dizer: «Ora bem, ouvi esta música em português — levem lá doze pontinhos que a coisa soou-me bem.»

(Por outro lado, a vitória não deixou de ser um prazer muito tribal. Portugal ganhou e pronto. Se tivéssemos ganho com uma música em inglês, desde que a vitória fosse nossa, ninguém ficaria assim muito chateado.)


Ah, com esta mania das línguas ibéricas, acabei por não falar daquilo que pensei quando comecei a escrever: do hebraico, a língua ressuscitada — e do húngaro — e do bielorrusso — e das outras línguas que por lá ouvimos. Na verdade, foram poucas. Para um festival europeu, a coisa foi muito monolingue

Não faz mal. Isto da Eurovisão é de modas. Nos anos 70, as canções soavam todas aos ABBA. Nos anos 90, a Irlanda era o farol da Eurovisão. Depois, veio a loucura dos primeiros anos deste século, em que valia tudo, menos cantar numa língua que não fosse o inglês. Portugal chegou sempre a estas modas com algum atraso e também por isso nunca ganhou nada. Desta vez, atravessou-se à frente e apresentou uma coisa diferente da moda dos últimos anos — e ganhou. É por isso que já muitos prevêem a moda do «vamos todos cantar músicas calmas na nossa própria língua». Será esse o mote da Eurovisão em 2018 — numa cidade perto de si…

O que significa que para o ano terei muito mais para falar sobre as línguas da Eurovisão do que este ano. Cá estaremos, pois então.

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Autor
Marco Neves

Professor na NOVA FCSH. Autor de livros sobre línguas e tradução. Fundador da Eurologos.

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30 comentários
  • Bom, nós mandamos este ano um galo; mais pro ano imos mandar um lince ibérico e assim quiçais já nom fiquemos últimos.
    Era visto! Esteve-lhes bem aos do 40 principais por amanhar tudo. Pra que aprendam!
    Ah, e vaia “nivelazo” d´inglês. Pronúncia esquisita, né?
    http://www.abc.es/cultura/eurovision/abci-gallo-manel-navarro-respuesta-manel-navarro-gallo-eurovision-2017-invitado-no-deseado-201705132323_noticia.html
    http://www.elmundo.es/television/2017/02/13/58a1a808e5fdeab3698b4617.html
    http://www.vanitatis.elconfidencial.com/television/programas-tv/2017-02-14/la-sexta-noticias-amano-malversacion-objetivo-eurovision-tve-manel-navarro_1332076/

    • Bom, bem pensado; pro ano imos mandar ò melhor cantante da Espanha é que; aliás, é galego. Mariano Rajoy! Com certeza que o faria melhor có Manel Navarro isse e que nom remataria último.

  • Portugal ganhou cũa cançom galega, parabéns. É ũa boa cançom, feita por ũa excelente compositora e executada por um cantor algo medíocre (acho que a sua irmã cantava melhor ca ile; mais, isso sim, polo menos cantou melhor có inútil da Espanha. Até um cantante de “chuveiro” o faria melhor co Manel Navarro isse). Cando estava a cantar, semelhava drogado ou algo parecido… No entanto, fazia-lhe falha um transplante de coraçom e por isso ganhou. Já ocorreu o mesmo com aquila mulher com barba. Pola cançom, nom ganhou; isso sabe-o todo o mundo.
    Isto tamém passou na Espanha co Chiquilicuatre. A cançom era pra ficarmos últimos, mais o gajo era engraçado e assim puidemos ficar 16º. Iste ano passou ũa cousa semelhante, coa diferença de que o cara nom tinha rem de graça… Bom, sim, os memes do seu “galo”. Quiçais, passárom fronteiras e os portugueses rírom-se um cacho e decidírom votar pola Espanha. Mal feito! Isse homem nom merecia nem um ponto. Nom merecia nem estar n´Eurovisom. Bom, pro ano já vos mandaremos algũa bicharia dissas a Lisboa.
    Portugal ganhou a Eurocopa, Eurovisom.. Que será o seguinte?
    E Espanha teve o que merece. Nom a Espanha, mais Castela. Que parvadas som issas de falar castelão por toda a Espanha! Issa gentalha é moi altiva, som seres desprezíveis. E a RAE dizendo que a cançom da Espanha teria d´estar integramente no castelão. Ulo galego? Ulo catalám? Ulo euskera? Ulo resto?
    O ano passado, 2016, foi a primeira vez que a Espanha levou ũa cançom integramente no inglês; idioma que nunca se falou nem se fala em nengũa parte deste país. E dende finais da década passada, é habitual vermos misturas antre o castelão e o inglês. Antes, apenas ouve canções no castelão. Por que nom no resto d´idiomas que si que se falam neste país? Eu quero viver na Espanha; peró nũa Espanha democrática e confederal formada por catro nações; e nas que existe respeito polas culturas, tradições e línguas próprias de cada naçom. Issa é a Espanha na que quero viver. Isse é o país no que quero abitar. Mais, pra morar nũa Espanha coma a atual, prefiro que a Galiza se emancipe; mália que isso signifique ser um estado com tam pouca importância internacional (e tam desconhecido) como pode sela Lituânia. Capital de Lituânia? Cantos responderiam corretamente a issa pergunta sem olhar na Wikipédia?
    Apenas a metade dos catalães querem a independência. E moitos deles se conformariam ca maior autonomia. Ora bem, se a Espanha estiver disposta a transformar-se no que eu digem, digo-che que deixariam d´aver movimentos independentistas (sérios, é dizer, com votos e representaçom parlamentar) na Espanha.
    http://www.lavanguardia.com/television/20170212/414274082519/rae-reitera-cancion-eurovision-deberia-ser-castellano.html
    https://materiasdidaticosetraducoes.wordpress.com/

    • Além das duas conquistas portuguesas mencionadas por Anônimo Galego (Eurocopa e Eurovisão) outras duas a estas vem se somar: O Melhor Jogador do Mundo Cristiano Ronaldo e a Presidência da ONU com Antônio Guterres… Os povos lusófonos devem estar felizes, como eu mesmo estou… Muito interessantes as observações de Anônimo acerca de todas as questões levantadas… parabéns…

  • gostei de ler.
    mas em Portugal a segunda língua é, oficialmente, o mirandês. embora muito pouca gente a fale. em Trás-os-Montes aprendem-se as duas nas escolas.
    cumprimentos

  • Li a crónica (e os comentários disponíveis) com o agrado habitual do meu acompanhamento deste blog. Sendo um blog sobre “lingua”, é também um blog sobre cultura, viagens e, coisa muito importante, bom senso.

    Aqui à poucos dias estive a ler o “História da lingua”, livro em BD relativo à lingua Galega, publicado à uns 25 anos e reeditado o ano passado.
    É um grande panfleto à corrento do reintegracionismo (https://pt.wikipedia.org/wiki/Reintegracionismo) e dá-nos (sobretudo aos portugueses não integrados nesta coisa das linguas) uma noção de que milhões de pessoas na Galiza considera a lingua Portuguesa e Galega como sendo (práticamente) a mesma. É interessante!
    Nele, aprendemos que o “esmagamento” à lingua galega conmeçou logo na idade média, não sendo um “exclusivo” dos tempos modernos.
    E goste-se ou não, concorde-se ou não, compreende-se. O estado central necessita de uma nação unificada. E essa unificação passa pela lingua. Ou por um extremo nacionalismo como é o dos USA. Sendo que os Estados Unidos conseguiram esse extremo nacionalismo porque não tinham séculos de história em cima.

    Subentendo que o Marco será um apoiante da indepêndencia da Catalunha. Eu sou mais da opinião do Anônimo Galego. Se fosse atribuida mais autonomia às “outras” três nações que integram Espanha, creio que seria muito preferivel a uma ainda maior fragmentação da Europa.

    Falando agora da Eurovisão. A vitória portuguesa (e, segundo a corrente reintegracionista, também Galega, visto que foi cantada em português), já vem tarde. Aceitamos que mais vale tarde que nunca, mas… a maioria dos portugueses (e dos europeus?) já deixou de estar agarrado à televisão nessa noite.

    Mas… a vitória é sempre boa.
    Parabéns aos dois Sobrais e todo o conjuntos que criou a musica e os apoiou ao longo do caminho 🙂

    • Paulo: não sou necessariamente a favor da independência. Se pudesse escolher (mas não tenho muito a ver com isso, para dizer a verdade), acho que preferiria uma Espanha que assumisse as várias nações e línguas em problemas. Uma Espanha que, por exemplo, levasse sem problemas uma canção em catalão à Eurovisão. Uma Espanha onde as várias línguas fossem dadas como opções de aprendizagem em todo o território. Mas estamos muito longe disso e, desta forma, compreendo a pulsão independentista.

      • Muito bo o seu comentario Marco
        acho que non se pode amosar con tanta claridade o que acontece na Espanha
        Obrigado polas suas opinions e tamen por ficar perto dos galegos que ainda temos no corason a Portugal como irmaos que somos.

      • Isso poderia fazer que ouvesse menos paro na Espanha, com efeito. A demanda de professores aumentaria bastante, na circunstância que propões. Mais tardariam ũus anos n´aver oferta dabondo.
        O probrema dos movimentos independentistas da Espanha é isse: querem a independência. E moi poucos espanhóis querem separar-se das outras três nações por completo. O probrema do conflito independentistas e os poderes castelãos de Madrid é que estám a deixala questom em “tudo ou nada”. E, realmente, moi espanhóis querem isses dous extremos. Na realidade, se as catro nações espanholas estivem governadas cũa formas semelhante ao “tudo”, mais sem chegar à emancipaçom total; o independentismo, simplesmente, deixaria d´existir. Nom averia case ninguém que votasse por iles, nissas circunstâncias. Deixariam de ter representaçom e votantes polo absurdo da sua existência. Isso faria que os partidos independentistas mal puidessem sobreviver, extinguindo-se.

    • Bom, admito que iste ano nom estivem moi atento à Eurovisom. Porque eu quero ver um Eurovisom, nom um Anglovisom. Na final, os únicos que cantárom integramente nũa cançom diferente do inglês fôrom Portugal, a Itália e a França. E logo a Croácia e a Espanha figérom misturas. Os 20 países restantes cantárom no inglês. E isso já aborrece.
      E os reintegracionistas nom fôrom os únicos que afirmárom que o galego ganhara Eurovisom. Na Rádio Galega andavam a dizer que a vitória de Portugal era coma se tivesse ganhado a Galiza, que a cançom era praticamente galega… E que, realmente, a cançom era galega e cantada num sotaque lisboeta. Isso deveria ser motivo d´orgulo pros galegos, a nossa língua cantada e falada de milhões de maneiras distintas. E, polo vista, assim é.
      E pro mês de junho vém a Taça de Confederações. Melhor apostar pola vitória de Portugal, visto o sucesso que está a ter em tudo. Mágoa que nom vai ser moi pagada…

  • «Isto não é coisa para mudar o estado da música portuguesa — seja ele qual for» – pois não. Por isso, muito me admirou ver o Tozé Brito no Telejornal dizer que esta vitória era muito importante para a música portuguesa. Porque se dizem ainda coisas destas? Uma vitória na Eurovisão não serve para nada, como bem diz. Moro na Alemanha e ainda não ouvi a canção uma única vez na rádio alemã, apesar de o júri alemão ter dado 12 pontos ao Salvador Sobral.
    Foi apenas um sonho de infância realizado, como, mais uma vez, muito bem diz. Eu é que não posso dizer destas coisas nas redes sociais. Porquê? Porque moro na Alemanha e vêm logo acusar-me de que me estou a armar ao pingarelho. Enfim…

  • Fiquei contente com a vitória do Salvador Sobral pois gostava dele mesmo antes do festival. Além disso, sempre é bom ter um mais argumento para aqueles que dizem que “o galego non serve para nada pasado O Cebreiro”.
    Mas se o professor me permite, gostaria de esclarecer uma questão. O catalão não é língua minoritária na Catalunha (como também não o é o galego), pois, como escreve no artigo, o catalão é falado pela maioria da população. O que é, pelo facto de non te reconhecidos os seus direitos linguísticos num estado centralista, minorizada. Acho importante fazer esta diferença.
    E já instalada nesta ousadia, dizer que quando falamos de bilinguismo falamos de falantes, não de paises; nem sequer cidades. O falso bilinguismo que se vive em Bruxelas não é outra coisas que a coexistência no mesmo espaço de duas/três linguas diferentes, algo muito dificil de suportar em qualquer outra cidade e impossível para um estado. Por certo, falei em “coexistência” não “convivência”, pois é dificil a harmonia quando se deseja o mesmo.
    Desculpas por este longo comentário, mas achei muito interesante o blog e deixei-me levar da emoção.
    Um saudo,
    Susana
    PS: Espanha ganhou um festival de Eurovisão (não lembro o ano) com a canção “La, la, la” cantada por Masiel, pois Serrat negou-se a ir porque não permitiam que cantasse em catalão, língua em que foi escrita.

    • Muito obrigado pelo comentário e pelos esclarecimentos, que me parecem muito úteis! Quanto ao minoritário, uso-o na perspectiva no Estado em que a língua é falada, por enquanto o espanhol. Vai na sequência do que refiro quanto ao ucraniano: era uma língua minoritária (na União Soviética) e deixou de o ser com a independência. Talvez não tenha sido explícito neste ponto. Bem, mais uma vez, muito obrigado e espero que continue a visitar-me por aqui.

    • A Espanha ganhou o festival d´Eurovisom no 1968 e 1969. Teve a oportunidade de ganhar vários anos depois, nom sei se seria no 1981, já que a Espanha chegava líder à última votaçom e nós votamos ao final. No entanto, a TVE lhe deu 12 pontos ao segundo pra que ganhasse; já que nom tinha cartos pra celebrar um festival d´Eurovisom. A RTP tem cartos dabondo pra celebrar Eurovisom o ano que vém? A TVE nom vai sobrada de grana, teria dificuldades pra celebrar um festival dessas caraterísticas. Como a RTP nom goze de melhor saúde…

      Nota: Nom foi no ano 1981, mais no 1979 (https://es.wikipedia.org/wiki/Festival_de_la_Canci%C3%B3n_de_Eurovisi%C3%B3n_1979

      • Pois é! Mas a sua variedade de línguas não é bilinguismo senão co-linguismo. Quer dizer, cada língua tem o seu território e neles cumprem todas as suas funções.

        • Issa é ũa opçom prá Espanha. O co-linguismo.
          A outra seria, seguindo o exemplo árabe, a criaçom dum romance “neutro”; ũa espécie de latim, mais adaptado aos tempos (reunindo as evoluções comuns à maioria das línguas romances, neologismos…). Esta língua seria utilizada em case tôdalas matérias do ensino (menos a da língua do lugar), nos meios de comunicaçom e prá comunicaçom antre tôdolos falantes de línguas romances.

  • Escócia tem seleçom de ludopédio. Acô á gente que o pede, com efeito.
    Se eu puider eleger, elegeria que as catro nações tivessem a sua seleçom pros amigáveis, categorias inferiores e Eurocopa. No entanto, o Mundial e a Eurocopa sub-21 (polos Jogos Olímpicos) se teriam de jogar cũa seleçom espanhola; pra ter mais possibilidades d´êxito. Na Eurocopa, pra catro ou cinco países que á… E nas categorias inferiores, estando divididos poderám ver-se mais jogadores pra comprovalo seu nível; cousa moi importante nos rapazes.

    • Ademais, a Escócia tamém tem liga profissional de ludopédio; com grandes equipas coma o Celtic ou o Rangers. No entanto, a Suíça é ũa confederaçom e tem ũa única seleçom nacional e ũa única liga nacional (na que tamém participam as equipas do Liechtenstein, coma o Vaduz).

  • Quando eu era criança, nas aldeias do Norte falava-se um português bem diferente do português citadino, digamos assim. E o que é certo é que eu realmente considerava que falava (e ainda falo…) dois tipos de português diferentes, para me fazer entender pelas gentes da minha terra. Já para não falar do português do Brasil, que se falava na minha casa, e eu pensava ser um português “de família”, digamos assim”, só bem mais tarde entendi ser o português do Brasil… e mais o português de Moçambique, que se lhe acrescentou uns anos depois… hehe Mas voltando ao português das aldeias: havia quem lhe chamasse “parolo”, um português de quem não sabia falar bem português. E só mais tarde percebi ser o português galego, ou arcaico, na verdade. E como isso fica reforçado ao ler o “Anônimo galego”, quantas palavras da minha infância… que me fazem sentir tão bem: afinal, não era “parolo”, era apenas galego, que se está perdendo aos poucos, porque nas aldeias do Norte já não se fala mais assim.

  • Como bem dige o Paulo enriba, o galego da Galiza está a sofrer um processo de castelanizaçom dende a Idade Média. E, dende issa época, as falas galegas estivérom isoladas do resto de variantes da nossa língua; que os portugeses levárom pros catro cantos do mundo. O lado mau foi que moitas das novas invenções as denominamos coma no castelão, somado à profunda castelanizaçom que está a sofrela nossa fala na Galiza. O lado bom (praticamente o único bom) é que, ao estarmos ilhados durante tantos séculos do resto de falas da nossa língua (literalmente, nem sequer as falas galegas estavam conetadas; daí que haja bastantes diferenças antre ilas), a Galiza conservou vários traços que se perdérom no resto da galaicofonia (ou lusofonia) á bem tempo. E ista é ũa vantagem e ũa peculiaridade que nom moitos reintegracionistas querem aproveitar. Ũa mágoa.
    Olha os comentários diste artigo (http://praza.gal/opinion/3989/imagina/). Ou iste vídeo (realmente, moitas lusistas querem isso):

    • Nota: Os lusistas som pessoas que, como o seu nome indica, escrevem no padrom lusitão; renunciando a tôdalas peculiaridades genuínas que possam telas falas da Galiza. É mais, até renunciam a algũas opções galegas coincidentes co Brasil. Iles sempre tentarám usar o que se use em Portugal, mais tamém podem conter algũas contaminações do castelão (é díficil escapar totalmente disso. Ou impossível).
      Os reintegracionistas simplesmente adaptámola norma da RAG ao padrom reintegracionista, um padrom semelhante ao da Idade Média e o libra de castelanismos desnecessários. Nossoutros usámola fraseologia, sintaxe, semântica, léxico e vocabulário enxebres da Galiza e defendemos a sua utilizaçom.

  • Não deixa de ser engraçado ver um português a se queixar do monolinguismo castelhano quando em Portugal só falam português (e agora ninguém tire a piadinha do mirandês, façam favor) xDDD

    • Precisamente: Portugal não despreza as línguas de parte significativa da população porque elas não existem (o mirandês é mais comparável ao aranês do que ao galego, catalão e basco). Se existissem, criticaria a mesma atitude de desprezo que existe em Castela (que provavelmente também existiria por cá, infelizmente).

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