Certas PalavrasPágina de Marco Neves sobre línguas e outras viagens

Porque insistem os galegos em falar galego?

A alguns espanhóis (e alguns portugueses, há que dizer) faz confusão a insistência no uso de línguas consideradas minoritárias. Para quê insistir na educação em galego (ou catalão, basco, etc.), se podem todos aprender uma língua falada por 300 milhões de pessoas? Para quê este esforço?

Para começar, nada impede os galegos de aprender espanhol. Não só nada impede, como todos os galegos aprendem, efectivamente, a língua comum a todo o Estado. Assim, a comunicação com os outros espanhóis e com os milhões de falantes de espanhol por esse mundo fora está mais do que assegurada.

O problema, claro está, é este: é muito difícil convencer alguém que a sua língua não serve. Que pode ser descartada, porque não é útil sabê-la. Quase todos nós reagimos violentamente contra este tipo de argumentação.

Perguntem a qualquer espanhol se aceita que o inglês se torne, mesmo que gradualmente, a língua da educação em Espanha, substituindo gradualmente a sua própria língua. Começam, claro, os argumentos contrários, sejam eles quais forem.

Perguntem também a um brasileiro se aceita substituir a sua língua por outra qualquer no sistema de ensino. Ou a um português. As respostas não tardarão.

As pessoas querem comunicar, claro. Aprendem o que for preciso para isso. Mas não aceitam que lhes digam que a língua em que cresceram não serve para nada. Querem viver na sua língua e, depois, aprender também as línguas que lhes sejam úteis a cada momento da vida.

UMA VERSÃO REVISTA DESTE ARTIGO FOI PUBLICADA NO LIVRO
DOZE SEGREDOS DA LÍNGUA PORTUGUESA.
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Autor
Marco Neves

Professor na NOVA FCSH. Autor de livros sobre línguas e tradução. Fundador da Eurologos.

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12 comentários
  • A mim pessoalmente, o galego serve-me para perceber sem dificuldade o que o senhor escreve sem ter estudado nunca a língua de Camões.

    Acho que o senhor também não há ter demasiados problemas para perceber o conteúdo destas linhas nem para identificar o código como português , embora seja um português esquisito. E, insisto, eu nunca estudei a língua portuguesa!

    Em resumo, o galego serve-me para comunicar-me com mais de 200 milhões de pessoas espalhadas ao longo de quatro continentes.

    Se a isso somamos o castelhano, já temos mais de 500 milhões (sem contar os utentes que tenham o espanhol como segunda língua). Isso sem muito esforço. O potencial linguístico da Galiza é enorme. Ou será, o dia que acheguemos o galego um bocadinho do português.

  • Não tenho muito mais a dizer a respeito do que ja diz Miro Moman. Eu sou galega e Tenho a sorte de ter uma língua extensa e útil com que comunicar com muitos milhões de pessoas no mundo. A minha língua pode ser chamada de galego, de português, de galego-português ou do que for… e pode também ser escrita com ortografia castelhana, galega, árabe ou com carateres chineses, que de qualquer maneira vai continuar sendo a língua que é: o romance hispano occidental que nasceu no território dos galaicos, enriquecido hoje por uma imensa variedade de falas nos cinco continentes, aos cales chegou a ação do império português. Como não vai ser útil falar uma língua como a que temos em comum quem suscreve este artigo, Miro Momán, eu própria e mais 250 milhões de pessoas no mundo?

  • Perguntado Pep Guardiola (o anterior treinador do F.C. Barcelona), depois de ter ele falado em catalão com um jornalista catalão numa roda de imprensa internacional, por que os catalães falam catalão, respondeu: “os catalães temos uma língua… e usamo-la”. Lógica aplastante e ponto final a discussão. Já ninguém perguntou mais nada sobre o assunto. :))

    Afinal uma língua serve para que um conjunto de pessoas possa se comunicar entre elas. Logo, quem diz que uma seja melhor que outra? Por isso, se os galegos falamos galego (português) é porque “temos uma língua… e usamo-la”. :))

    • O de “aplastante” é mostra típica de neocastrapo. Nos meus tempos de pequeno, a xente que tentaba falar castelán no Impaís non dicía “aplastar” senón “esmagar”. Agora é ao contrario: querendo falar galego dise “aplastante” no lugar de “esmagador”. Impaís á toa…

  • Resulta absurdo o negarse a aprender. Lembro certo día que, non atopándoa en castelán, merquei a Ora Marítima de Avieno…en catalán. Aprendín moito…e non me mordeu.

  • “Perguntem também a um brasileiro se aceita substituir a sua língua por outra qualquer no sistema de ensino.”
    Aqui no Brasil este tipo de proposta seria aceito por muita gente – aliás, já há quem queira “internacionalizar” universidades brasileiras, propondo ensino superior nelas apenas em inglês. (Esta medida criaria uma nova e numerosa classe social no país: a dos “sem-inglês”, pois nosso sistema público de ensino é incapaz de ensinar línguas estrangeiras, e para aprendê-las aqui é preciso pagar cursos em escolas especializadas.)
    Tal sentimento – que não é o meu, por mercê de Deus! 😉 – é porém o de muitos brasileiros, que põem nos portugueses a culpa por nossos problemas e lamentam que não tenhamos sido colonizados pelos ingleses, ou que os holandeses não tenham ficado em Pernambuco e expandido seu território para o resto do Brasil.
    Conheço pessoas que consideram o português – a própria língua materna! – como uma língua inútil, um código secreto que só nós falamos (sim, e estes ainda por cima se esquecem, quase sempre, de que o partilhamos com os portugueses e os povos de outras ex-colônias).
    Tal aversão à própria língua vem acompanhada de desprezo pela literatura lusófona, ojeriza pelos acentos (gráficos) – se o inglês não os tem! – e outras coisas mais.
    Veio construindo-se a ideia, abraçada por muitos, de que os brasileiros falamos uma língua emprestada, que não é nossa, daí o pouco apego, quase descaso quanto a ela – em franco contraste com o que se vê de parte de muitos portugueses, principalmente em tempos de discussão de acordos ortográficos.

  • Porquê os catalães (eu sou maiorquim) falamos català entre nós, com a família, com us filhos, em toda a parte? Porque queremos falá-lo, entre outras razões.

    Peço perdão pelas minhas faltas de português, língua pela qual sinto devoção.

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